segunda-feira, 30 de abril de 2012

EU ACHO OUTRA COISA


Ela contou que estava triste e que saiu de casa para caminhar um pouco, ver gente e beber uma água de coco, por isso foi à praia. Correu no calçadão, deu um mergulho e ficou jogando conversa fora com um pessoal que estava na barraquinha de coco gelado, não viu o tempo passar e, quando deu por si, já estava escurecendo.
Mas eu acho que aconteceu foi outra coisa muito diferente. Tudo planejado. Marcou encontro com o amante na esquina de casa, entrou no carro dele e foram para uma praia lá longe, bem deserta. Deitou e rolou na areia, se fartou, se esfalfou e voltou já noite alta toda molhada, com o cabelo todo desgrenhado....
Ela tem essa mania de me contar o que ela acha que fez. Eu deixo. Sei que deve ser tudo mentira, mas deixo. Escuto. Mas acho sempre que ela fez mesmo outra coisa bem diferente daquela que ela contou. Aquela cara de franga esconde as galinhagens dela, mas eu supero essa tragédia todos os dias e digo a mim mesmo que amanhã vai ser diferente.
Outro dia, na hora de dormir, me apareceu de calcinha vermelha. É claro que eu estranhei e perguntei o que significava aquilo e ela veio com um papo careta que era pra me seduzir, que a gente estava distante um do outro, que ela achava que eu estava frio com ela, chorou e tudo. Eu até disse que isso, eu te amo, é que estou com uns problemas lá no trabalho e a gente até transou...há tanto tempo a gente não transava que eu já estava até me esquecendo de como ela é linda e gostosa.
Mas aí eu me toquei que devia ser tudo mentira e a transa acabou. Ela deve ter comprado a calcinha vermelha pra vestir para algum vagabundo na rua e, aí, pra me enrolar, pra evitar que eu desconfiasse quando ela, por acaso, esquecesse a calcinha no varal, ela resolveu vestir e me mostrar. Filha da puta!
Não sei porque ela mudou tanto. Namoramos um tempo curto, é verdade, mas era diferente. Ela me falava a verdade e eu acreditava. Era simples assim. Depois de casados, tudo mudou. Bem que meu pai falava que mulher quer mesmo é casar e que você casa com uma, mas leva outra pra casa. Meu pai sabia das coisas, por isso separou da minha mãe.
Eu me lembro bem do dia em que cheguei em casa e ele tinha dependurado minha mãe de cabeça pra baixo.  Saí correndo pro meu quarto e fiquei lá bem quietinho enquanto ele chorava olhando pros cabelos longos da minha mãe que tocavam de leve o chão da sala. Mas aí chegaram os vizinhos, desamarraram minha mãe e ameaçaram meu pai de chamar a polícia. Fiquei morrendo de vergonha dos vizinhos.
Depois disso, nunca mais vi minha mãe. Meu pai me pegou e me levou pra casa da minha avó. Ele me contou que minha mãe mentia e que não queria mais viver com ela, mas eu e ele sempre ficaríamos juntos. Vovó confirmou tudo, silenciosamente, mas confirmou. Ficamos juntos mesmo, até eu conhecer a Vera. Aí, como uma maldição, me esqueci dos conselhos dele e me apaixonei por ela. Me apaixonei e virei um palhaço nas mãos dela, porque homem que se apaixona é palhaço. Mas não me dei conta logo, só depois do casamento. E agora é esse inferno.
A Vera diz que gosta de pudim, mas eu acho que ela gosta de cocada. Ela diz que gosta de MPB, mas eu acho que ela gosta de funk. Ela diz que vai pro trabalho, mas eu acho que ela vai pra rua, bater calçada. Ela diz que gosta dos seus aluninhos, mas eu acho que ela gosta dos pais daquelas pobres crianças. Ela diz que gosta de mim, mas eu acho que ela não gosta de ninguém, porque mulher não gosta da gente, mulher só quer se aproveitar.
E o pior, é que nem coragem eu tenho de contar pro meu pai sobre o covarde que eu sou. Se ele prestar atenção na minha vida, deve imaginar que quem puxa aos seus, não degenera. E ele deve esperar pelo dia em que eu vou dependurar a Vera de cabeça pra baixo e ir até o fim, coisa que ele não conseguiu concluir com a minha mãe. Ele deve achar que seu filho é fodão. Mas eu acho outra coisa.


sexta-feira, 13 de abril de 2012

segunda-feira, 2 de abril de 2012

AS CORES DE ABRIL - Vinícius de Morais

As cores de abril
Os ares de anil
O mundo se abriu em flor
E pássaros mil
Nas flores de abril
Voando e fazendo amor
O canto gentil
De quem bem te viu
Num pranto desolador
Não chora, me ouviu
Que as cores de abril
Não querem saber de dor
Olha quanta beleza
Tudo é pura visão
E a natureza transforma a vida em canção
Sou eu, o poeta, quem diz
Vai e canta, meu irmão
Ser feliz é viver morto de paixão