quinta-feira, 24 de setembro de 2020

QUARENTENA

 

Meus cabelos brancos no espelho
Refletem meu medo
O medo tem raízes fortes
Mas tingimos os galhos de dourado
Para fingir uma calmaria que não existe.
Minha mãe na fotografia da sala
Me dá medo
Medo de não ter mais suas mãos
Me afagando
Me dando palmadas
Me indicando o melhor caminho a seguir.
A imagem de minha neta na tela do celular
Me dá medo.
Medo de não ver desabrocharem
Todas as primaveras que ela sugere
Medo de não lhe dar colo
Abraço, afago,
Tapioca com tomate, queijo e orégano, vovó.
O rosto de minhas filhas na tela do computador me dá medo.
Medo de não mais rir juntas
Medo de não ouvir mais
Você vai sair com essa roupa, mãe?
Medo de não mais pensar junto
Nas saídas para problemas emocionais
Profissionais
Existenciais
Saídas para o nosso país tão triste.
Mas acordo toda manhã
Lavo o rosto, renovo o olhar
Passo álcool nas mãos
E vejo o que dá para fazer
Para que a vida não tenha sido em vão.