EMBAIXO DA ÁRVORE PELADA
Foi há pouco
tempo que descobri seu nome. Para mim, sempre foi a “árvore pelada”. Ficava no
jardinzinho de entrada da casa de minha mãe e dava umas flores brancas
lindíssimas, de suave perfume; seu tronco era liso, robusto, com uns desenhos
muito bonitos e soltava uma seiva leitosa quando ferido. As folhas eram duras,
grandes, largas e brilhantes, de um verde escuro peculiar. Lá pelo mês de abril
ou maio, ela se transformava na árvore pelada, pois caíam-lhe todas as folhas.
Nessa época ela também era linda! O jasmim manga começava a florescer em final
de agosto e a árvore se vestia de novo na primavera, mostrando todo o seu
esplendor.
Embaixo
da árvore pelada, muita coisa aconteceu. Ela foi testemunha ocular e paisagem
para fotografias de muitos momentos importantes de minha vida. No início, ainda
um arbusto e, depois, grande, cheia de galhos, tomando quase que a entrada toda
da casa, encobrindo o portão e fazendo sombra no pedacinho de varanda onde meu
pai pegava sol pela manhã.
Tenho
uma foto com um barrigão de seis meses de gravidez, uma promessa que se
anunciava, embaixo da árvore pelada.
Fiz
corações e escrevi iniciais com uma faquinha no tronco da árvore pelada. As
letras e os desenhos foram ficando disformes conforme a árvore pelada crescia,
assim como os meus antigos amores.
Vi
meu pai voltar a dar seus primeiros passos após o derrame, embaixo da árvore
pelada.
Enchi
de serpentinas a árvore pelada.
Coloquei
bolas coloridas e pisca-pisca para transformar em árvore de Natal a árvore
pelada.
Amarrei
umas cordas e transformei em varal de fraldas os galhos da árvore pelada.
Deitei
no chão e fiquei uma tarde quase inteira olhando para o céu, pensando nos meus
problemas e tropeços, por entre as flores da árvore pelada.
Amarrei
meu cachorro, depois de ter-lhe dado banho, para que secasse embaixo da árvore pelada.
Varri
o quintal para recolher as folhas que caíam no chão embaixo da árvore pelada.
Tirei
fotos do bloco de carnaval, todo mundo fantasiado, embaixo da árvore pelada.
Um dia, minha
mãe resolveu se mudar da casa e minhas histórias ficaram registradas na árvore
pelada, que foi cortada pela nova moradora para que se pudesse fazer uma
garagem para o carro novo.
Do livro: Mulheres que correm com as baratas, Editora Torre, Rio de janeiro, 2011
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